domingo, 19 de maio de 2013

Monte Ryu - A Montanha do Dragão

Feriadão no Japão e eu e o Lord nos preparávamos para mais ascensões, a ideia era de subir duas montanhas em dois dias, porém o tempo acabou não ajudando e ficamos apenas com 1 dia de tempo bom. Afim de concluir os 7 cumes de Suzuka, escolhi o Monte Ryu, ou Ryugatake em japonês, com 1099 metros de altitude esse era o último cume dos 7 que me faltava e com isso concluiria uma das minhas metas.

Como essa montanha parecia não ser muito exigente, convidei Juquinha que outrora já havia manifestado o desejo de subir conosco, ele aceitou de imediato, então foi só passar as coordenadas para que ele se preparasse melhor e evitasse surpresas. Com a chuva do dia anterior e uma frente vinda do Norte, alertei que ele estivesse preparado para temperaturas abaixo de 5ºC e ventos de mais de 50 km/h.

No dia marcado partimos logo cedo em direção ao Vale Uga na cidade de Inabe, onde a partir de um Camping se iniciam diversas rotas rumo ao topo da montanha. Tracei uma rota que seguia por um vale passando por cachoeiras, alcançando uma crista e seguindo por ela até o cume, continuando por ela para iniciar a descida, porém como imprevistos acontecem logo na entrada do Camping tive que mudar tudo que havia planejado.

Conhecemos o Sr. Sakura, que cuida do Camping e orienta os montanhistas sobre as rotas, mostrei a ele o meu mapa com a rota traçada e ele me disse que estava desatualizado, a rota de subida não poderia ser seguida devido a erosão no local, a de descida ele desaconselhou, por isso aceitamos a sugestão de subir por uma crista central, perguntei sobre outra rota para a descida que também possuía cascatas, ele disse que não era uma boa devido a chuva mas também poderia ser utilizada.

O ponteiro do relógio mau tinha atingido o número 8 e já estávamos com o pé na trilha, a caminhada começou leve e passamos por duas grandes pontes que facilitaram a travessia dos riachos, aliás a bela estrutura do lugar chama atenção, não é atoa que temos que pagar para entrar, porém uma pechincha de cerca de 2 dólares, bem pagos devido as facilidades que encontramos, principalmente na parte baixa da montanha.

Duas mulheres haviam partido um pouco antes de nós, e viemos a encontra-las assim que a trilha ficou confusa, duvidas para todos os lados até que encontramos a placa que direcionava para a crista. Começamos a ganhar altitude rapidamente e Juquinha começou a pedir água, descansamos um pouco e partimos mas novamente ele começou a se queixar, uma das mulheres que seguiam na frente também parecia estar com o mesmo problema e as passamos e fomos ultrapassados por diversas vezes.

O cara reclamou tanto em certo ponto que parou até para soltar um barrão, expondo o seu traseiro branco para os animais da floresta. Eu tentava incentivar mas ele já estava dizendo que eu queria era engana-lo, pois seria difícil até o fim. Fui puxando o ritmo com paciência, mas se dependesse dele ficaríamos uns 3 dias na montanha. Lord vinha seguindo atras sem reclamar das paradas, aliás acho até que ele começou a gostar do ritmo mais ameno.

Fomos saindo da mata e com isso a crista se tornou rochosa, nada de grande dificuldade, mas pra quem já estava com a língua no pé, ficou um pouco pior. Já próximo de 1000 metros, um forte vento começou a soprar, uma névoa tomou conta do pico e indícios de que uma chuva poderia chegar. A temperatura baixou e paramos pra nos agasalhar, já não havia mais Sol e a névoa dominava a paisagem, enquanto isso as duas mulheres vinham descendo, elas estavam abortando o ataque por conta da mudança no tempo.

Nessa hora combinei com meus companheiros que não era hora de corpo mole, deveríamos apertar o passo para chegar ao cume antes da chuva, pela minha experiência parecia que não choveria, mas a possibilidade existia e era bom não ignora-la. Comecei a forçar o ritmo quando alcançamos a crista que leva ao cume, nesse momento o vento era tão forte que chegava a jogar o corpo de lado, Juquinha novamente sentiu o peso nas pernas e acabou sentando em meio aquele vendaval, eu disse que o cume estava próximo, mas ele disse que eu esta dizendo isso desde que começamos.

Não demorou muito e lá estava eu no topo do Monte Ryu, que significa Dragão, desta vez tive um gostinho especial, afinal eu havia alcançado os 7 cumes da cordilheira de Suzuka, alguns instantes depois e lá estavam meus companheiros juntos a mim, Juquinha estava exausto mas não dava para descansar muito ali em cima, o vento que segundo o próprio Juquinha era de 200 km/h, mas não passava de 55 km/h, fazia a sensação térmica se tornar negativa, por isso mau tivemos tempo de relaxar e já estávamos na descida.


Na saída do topo com uma visibilidade muito ruim entrei em uma rota que o Sr. Sakura não havia recomendado, Juquinha ainda me alertou se era por ali mesmo, não era, porém na minha cabeça já estava programado que era e acabamos descendo pelo caminho errado. Era uma crista extremamente íngreme e aproveitei para correr para baixo fugindo do topo pois as nuvens começaram a  trazer gotas de água. Esperávamos por um bom lugar para almoçar, mas o lugar era tão íngreme que tivemos que andar quase uma hora para enfim descansar.

Na ausência de um local decente para parar, acabamos parando em um lugar com grandes rochas pois pelo menos era possível sentar. Ali sentados saboreando os nossos "deliciosos" cup lamen e jogando conversa fora observávamos as grandes rochas que se postavam bem acima de nós e com qualquer movimento poderiam nos esmagar, mas felizmente todas mantiveram-se quietinhas em seus lugares.

Continuamos a descida e avisei a eles que faríamos apenas mais uma parada, continuamos descendo em um ritmo acelerado e logo alcançamos um vale, o caminho por ali seria longo porém sem dificuldades. Conforme o Sr. Sakura havia alertado que alguns pontos estavam meio ruins, muita erosão de rocha mas sem comprometer a trilha que ainda possuía uns paredões com grampos, em locais onde foram construídas barragens para conter o avanço da água.

Ao final dessa rota eis que encontramos as 3 cascatas prometidas, além de reencontrar a rota por onde havíamos subido, assim retornando sem dificuldade ao nosso ponto inicial. Juquinha? Bom pelo tanto que ele reclamou na subida até me surpreendeu seu ótimo desempenho na descida, além do seu humor que também estava ótimo, quem sabe descobrimos um novo montanhista para nos acompanhar.




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segunda-feira, 13 de maio de 2013

Monte Sen - O Retorno da Princesa da Primavera

Uma programação de última hora incluiu no mês de abril uma escalada ao Monte Sen, ou Sengatake em japonês, com 961 metros de altitude, essa é maior elevação de cidade de Kameyama e fica localizada no Sul da Cordilheira de Suzuka. Eu já havia cogitado subir essa montanha no último outono, o que acabou não se concretizando, por isso achei uma boa oportunidade para conhece-la. Minha ideia era de levar minha filha Kaori junto, por isso consultei o líder Taro para saber se a rota era tranquila, ele me informou que a trilha era variável e se ela não tivesse medo de altura não haveria problema.

Com tudo preparado, no dia anterior a escalada recebo o e-mail de confirmação onde ele informava que o terreno era íngreme, além de possuir rochas e cachoeiras. Isso me deixou um pouco com um pé atrás com relação a Kaori, porém como em montanha Taro tem a minha total confiança, imaginei que ele sabia bem o que viria pela frente, e estaria preparado para qualquer contratempo.

No dia marcado nos encontramos no pé da montanha em um vilarejo de Tanada, tipo de plantação de arroz em degraus, aguardamos em um estacionamento enquanto um grupo foi levar 2 veículos para fazer o resgate de volta, nesse caminho eles acabaram se perdendo, o que nos fez aguardar por mais de uma hora sob uma brisa gelada e consequentemente acabou atrasando um pouco o inicio da subida.

A trilha começou em um ritmo bem leve, praticamente um passeio no bosque, caminhamos uns 20 minutos até que saímos daquela trilha e adentramos em uma rota pouco usada, neste trecho enfrentamos uma descida íngreme e atolamos muito em uma mistura de folhas, galhos e lama. Depois daquela descidinha desagradável alcançamos uma corredeira, e era por ela que seguiríamos por um longo período.

Depois de muito atravessar de um lado para o outro chegamos em uma cascata, paramos para descansar com a bela paisagem e o som da água correndo. Taro chamou Kaori e lhe colocou um cinto de escalada, daquele ponto em diante ela seguiria encordada, o problema é que logo de cara teríamos que subir a cachoeira lateralmente, Taro subiu com a corda mas desistiu e alterou um pouco a rota que continuou difícil e algumas pessoas ficaram presas no meio, no final quem já estava no meio teve que seguir e um outro grupo precisou desviar o caminho.

Nós desviamos o caminho e não sei o que foi pior, demos uma volta subindo e depois tivemos que descer um trecho íngreme e escorregadio até encontrar o resto do grupo. A partir daquele ponto não tivemos mais vida fácil, a subida se tornou difícil e tive que ir puxando Kaori por uma corda, o que aos poucos foi me deixando exausto.

Com os contratempos e atrasos, Taro decidiu antecipar o local do almoço e paramos assim que alcançamos um vale mais aberto, porém ele mudou de ideia e decidiu seguir mais um pouco e parar em um pico que já estava próximo. Seria perto não fosse a pirambeira que tivemos que enfrentar e assim que alcançamos a crista ainda teve um trecho com correntes para vencer as rochas que levavam ao topo do pico.

Aquele pico não era o que se pode chamar de muito aconchegante e acomodar 10 pessoas no local não foi tarefa muito fácil. Ficamos ali por cerca de 40 minutos e apesar da temperatura agradável o Sol incomodava um pouco, a vista fantástica que se teria no local para mim foi substituída por uma enorme rocha postada a minha frente, que além de cobrir minha visão, ainda bloqueava a agradável brisa que soprava.

Com baterias recarregadas veio a crista rochosa que parecia infinita, a cada nova elevação Kaori me perguntava se aquele era o topo da montanha, mas para o desanimo dela este demorou a vir. Aos poucos o grupo foi se dispersando, para ela começou a faltar perna e para mim braço para puxa-la, mas a vida na montanha é assim, você se esforça para receber um premio e ele vem em forma de cume, desta vez não foi diferente e apesar da dificuldade lá estávamos nós.

Photo by Taro - Suzuhai

Kaori estava feliz e exausta, paramos para descansar um pouco mas a desvantagem de seguir no pelotão de trás é que você sempre vai descansar menos que os outros. Desta vez pelo menos o caminho de volta seria mais curto, porém para alcançar os carros que fariam o resgate teríamos que atravessar para a montanha do lado.

Continuamos seguindo pela crista e palavras de incentivo já não faziam mais efeito para ela que sentava cada vez que alguém parava para observar a paisagem ou fotografar. Desta vez carreguei peso dobrado e ainda fiquei com sede, pois tive que ceder toda minha água para que ela se mantivesse firme, ao final da crista nova subida para alcançar a pista, creio que pra ela foi o trecho mais difícil, tivemos que parar 3 vezes e cheguei lá em cima com a língua no pé, pois usei todo gás que me restava para ajudar ela a subir.

Exausto fiquei largado na pista enquanto foram buscar os veículos, então me lembrei que havia um bolo de fubá que minha esposa havia preparado na mochila e carreguei desnecessariamente por toda a travessia, distribui para todos e não conseguia explicar do que era feito aquele bolo, mas isso não importa, o importante foi que acabamos fazendo um lanche da tarde ali mesmo sentados no canto da pista.

Ao final seguimos para o estacionamento e Kaori indagada se voltaria para novas investidas me surpreendeu respondendo que sim, eu estava imaginando que ela nunca mais ia querer olhar para uma montanha. O mais impressionante é que no dia seguinte eu estava com dores até no cabelo enquanto ela estava inteira, sem qualquer fadiga. Que venham muitas outras montanhas pela frente!


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